Patrimônio
Uma solução histórica
Ideia é articulada com o Iphan e a Fundação Palmares
Paulo Rossi -
Uma das cicatrizes arquitetônicas do Centro Histórico de Pelotas pode ter uma solução. A antiga sede do Banco do Brasil e da Secretaria de Finanças, em uma das esquinas da Praça Coronel Pedro Osório na diagonal com a prefeitura, pode virar um centro de cultura negra. O edifício, junto com o Theatro Sete de Abril, hoje são pontos negativos à imagem e ao sentido de preservação dos prédios mais antigos da cidade.
A ideia toma forma nas reuniões do Fundo Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural (Funpatri) e já tem sinalizado significativos apoios do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e da Fundação Cultural Palmares, entidade vinculada ao Ministério da Cultura (MinC) e voltada para a promoção e preservação da arte e da cultura afro-brasileira. Há um mês, quando o conjunto histórico de Pelotas foi reconhecido como patrimônio histórico nacional em Brasília (DF), a prefeita Paula Mascarenhas (PSDB) teria apresentado a ideia à presidente do Iphan, Kátia Bogéa. Além de demonstrar grande interesse na proposta, a própria presidente em recente visita à cidade quis conhecer o prédio, conta o secretário de Cultura, Giorgio Ronna.
"Nosso plano A é transformar o espaço num centro de cultura negra dentro do centro histórico de Pelotas, que foi construído com mão de obra escrava e seria muito simbólico para a cidade", comenta Ronna. As duas instituições, Palmares e Iphan, tem interesse em montar dois escritórios técnicos em Pelotas para formular o projeto deste centro cultural. O presidente da Fundação Palmares já tem agenda confirmada em julho para conhecer as dependências. O prédio não foi incluído no projeto PAC Cidades Históricas, motivo de reclamações da secretária na época, Beatriz Araújo.
Quando o prédio voltou a integrar o patrimônio da prefeitura, lembra o secretário, foi solicitado um laudo de um engenheiro estrutural. O especialista teria vetado a possibilidade de desabamento.
Primeiras ações
O problema, no entanto, envolve as escassas verbas, explica Giorgio. O Funpatri possui hoje R$1,2 milhões de recursos. Na primeira reunião neste ano, por unanimidade foi aprovado o investimento de R$140 mil para a troca de aberturas da Secult, em más condições pela ação do tempo e de cupins. A Secult está orçando os serviços de limpeza geral, desratização e uma empresa para tapar as aberturas.
O último orçamento feito pela pasta para restaurar e adaptar o prédio histórico chegou a valores aproximados de R$5 milhões, hoje indisponíveis nos cofres públicos municipais. Até dezembro de 2016, o edifício pertencia à Câmara de Vereadores. A doação oficial consta ainda em uma placa fixada à esquerda da porta principal. O prefeito na época era Ancelmo Rodrigues e o presidente do legislativo era Ademar Ornel. A Câmara chegou a planejar uma restauração e a construção de um prédio anexo, porém nada saiu do papel e casa do povo permanece sem um endereço próprio.
Hoje o local é habitado por moradores de rua, pombas, ratos e morcegos. Algumas janelas estão abertas e outras com os vidros quebrados, chovendo dentro e destruindo ainda mais o pouco de original mantido no interior da edificação.
Ideia da Secult é fechar as aberturas, fazer uma limpeza geral e desratizar o ambiente. (Foto: Paulo Rossi - DP)
A reportagem não teve acesso ao interior do prédio com a justificativa de insalubridade do recinto. Da janela, é possível ver um ambiente bem destruído. Restam poucas características originais do seu interior. Um dos motivos para fechar as aberturas é também o impedimento da entrada de aves e morcegos.
A reunião do Funpatri para avaliar o orçamento e aprovar ou não as medidas iniciais está marcada para o dia 26 de setembro.
"Ideia extremamente importante para a comunidade negra"
A frase é da presidente do Conselho Municipal de Cultura de Pelotas, Daniela Brizolara. A simbologia, na sua opinião, vai no sentido de incluir o negro num espaço histórico construído por esta comunidade em situação de escravidão.
"São os principais agentes e trouxeram uma bagagem enorme, trouxeram cultura e influenciaram na cultura da cidade", manifesta.
Esta luta por um espaço como este, lembra, vem de anos e é capitaneado pela comunidade, movimento negro e pelo Conselho da Comunidade Negra. A localização, próximo a prédios históricos como Bibliotheca Pública Pelotense, Grande Hotel, prefeitura e Mercado Público posicionam a comunidade negra num espaço igualitário nos espaços urbanos.
"Pelotas é uma cidade negra. A mão de obra negra passou por todos aqueles espaços", lembra Daniela. Para a presidente, caso o centro seja concretizado, é um motivo de comemoração. Ela ressalva ainda que um centro não resolve todos os problemas da comunidade negra de Pelotas, no entanto, a iniciativa tem muito significado e importância para a população da cidade.
História do prédio
Localizado numa das esquinas da Praça Coronel Pedro Osório, o edifício foi construído entre 1926 e 1928. Foi projetado por Paulo Gertum e decorado internamente pelo arquiteto Fernando Corono para sediar o Banco do Brasil. Em 1972, o prédio também foi doado pela primeira vez para a Câmara de Vereadores e também não se instalou no local. A edificação então foi utilizado pela Secretaria de Finanças.
Ambiente interno está, aos poucos, sendo deteriorado pela ação do tempo. (Foto: Paulo Rossi - DP)
As informações são do livro 100 Imagens da Arquitetura Pelotense, de Rosa Maria Garcia Rolim de Moura e Andrey Rosenthal Schlee, repassadas para a reportagem através do pesquisador Guilherme Pinto de Almeida. O local está fechado há cerca de 10 anos.
Funpatri
O fundo foi criado em 2002 junto com o programa Monumenta e possui R$1,2 milhão de recursos. Em uma primeira reunião este ano, foi aceita por unanimidade, o investimento de R$140 mil na troca de aberturas do Casarão 2, sede da Secretaria de Cultura. O fundo é alimentado com orçamento da prefeitura, além de alugueis, concessões de uso, convênios, doações ou contribuições. O Funpatri é responsável por escolher as prioridades da cidade quanto a preservação do patrimônio. O grupo atualmente é coordenado pelo secretário de Cultura, Giorgio Ronna.
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